Introdução
A compreensão do autismo e da subjetividade das pessoas autistas é um campo de estudo em constante evolução. Enquanto abordagens comportamentais frequentemente focam em modificar comportamentos, a psicanálise oferece uma perspectiva mais ampla, centrada na singularidade do sujeito autista e na forma como ele constrói sua relação com o mundo por meio da linguagem e da voz. Autistas tendem a desenvolver padrões linguísticos particulares, como a ecolalia (repetição de palavras ou frases) e o silêncio, que, à primeira vista, podem parecer comportamentos sem sentido, mas que são formas legítimas de expressão e organização do mundo interno (Maleval, 2012).
Desenvolvimento
A linguagem desempenha um papel essencial no desenvolvimento humano, funcionando como mediadora das interações sociais e da construção de subjetividade. No caso de indivíduos autistas, a inserção no campo simbólico por meio da linguagem muitas vezes é marcada por dificuldades. O uso de ecolalia ou o silêncio não representam uma ausência de comunicação, mas sim uma tentativa de organizar e dar sentido ao real que o autista vivencia.
Para muitos autistas, o mundo externo é percebido como caótico e excessivo, o que provoca a necessidade de buscar formas seguras e previsíveis de interação. O fechamento no silêncio ou a repetição incessante de palavras são estratégias para lidar com esse excesso de estímulos, funcionando como âncoras em um ambiente que parece descontrolado. Conforme destacado por Maleval (2012), a ecolalia, por exemplo, longe de ser uma simples imitação, é uma maneira de simbolizar e processar o que está ao redor.
Ainda que comportamentos como o fechamento no silêncio possam ser interpretados como desinteresse ou incapacidade de interagir, eles muitas vezes representam tentativas de proteger-se do excesso de estímulos sensoriais e emocionais. A abordagem psicanalítica, ao valorizar a subjetividade do autista, permite uma compreensão mais profunda dessas manifestações e reforça a importância de escutar o autista em seus próprios termos, ao invés de forçá-lo a se conformar a padrões sociais que não correspondem à sua realidade.
Conclusão
A partir de uma perspectiva psicanalítica, a construção da voz e da linguagem no autismo deve ser vista como uma forma singular de organização da subjetividade. Compreender as manifestações linguísticas não convencionais, como a ecolalia e o silêncio, é essencial para respeitar e valorizar a singularidade do autista. Ao invés de tentar “normalizar” esses comportamentos, é fundamental criar um ambiente em que o autista possa expressar suas necessidades de maneira que faça sentido para ele, fortalecendo sua capacidade de simbolizar e interagir com o mundo.
Referências
Maleval, J.-C. (2012). O Autista e Sua Voz. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria.