Introdução
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição de neurodesenvolvimento com causas ainda não completamente compreendidas. Sabe-se que sua etiologia é multifatorial, com uma complexa interação entre fatores genéticos, ambientais e neurobiológicos. Estudos mostram que a combinação dessas influências pode aumentar o risco de uma pessoa desenvolver o transtorno. Embora a pesquisa sobre as causas do TEA tenha avançado significativamente, ainda há muito a ser descoberto. Este artigo explora os principais fatores envolvidos na etiologia do TEA e o estado atual da ciência sobre o assunto.
Desenvolvimento
Fatores Genéticos
A base genética do TEA é amplamente reconhecida. Pesquisas com gêmeos monozigóticos mostram que se um dos irmãos for diagnosticado com TEA, a chance de o outro também ser é de cerca de 80-90%, indicando uma forte influência hereditária. Em comparação, essa taxa de concordância é muito menor entre gêmeos dizigóticos, reforçando a importância dos fatores genéticos no desenvolvimento do transtorno.
Estudos de associação genômica ampla (GWAS) têm identificado várias mutações genéticas que podem estar associadas ao TEA. Genes como SHANK3, NRXN1 e CNTNAP2 foram identificados como tendo um papel importante no desenvolvimento das características do espectro autista. Além disso, grandes rearranjos genômicos, como microdeleções e duplicações cromossômicas, também aumentam o risco de TEA em algumas pessoas. No entanto, o TEA é altamente heterogêneo geneticamente, o que significa que diferentes indivíduos podem apresentar mutações em diferentes genes.
Fatores Ambientais
Embora a influência genética seja forte, os fatores ambientais também são importantes na etiologia do TEA. Alguns dos fatores mais estudados incluem:
- Idade parental avançada: Diversos estudos indicam que a idade avançada dos pais, especialmente do pai, está associada a um risco maior de ter filhos com TEA. Acredita-se que isso esteja relacionado ao aumento de mutações de novo nos espermatozoides com o passar dos anos.
- Complicações na gravidez e no parto: Prematuridade, baixo peso ao nascer e hipóxia durante o parto são fatores que podem prejudicar o desenvolvimento cerebral do feto e aumentar o risco de autismo.
- Exposição a substâncias durante a gestação: Exposição a pesticidas, poluentes e outras substâncias químicas também pode ser um fator ambiental que contribui para o risco de TEA. Estudos sugerem que a exposição a essas substâncias durante períodos críticos do desenvolvimento fetal pode interferir no desenvolvimento neurológico.
- Infecções maternas: Infecções durante a gravidez, como rubéola e citomegalovírus, têm sido associadas ao aumento do risco de TEA. A resposta imunológica materna a essas infecções pode afetar o desenvolvimento do cérebro do feto.
Fatores Neurobiológicos
Estudos de neuroimagem e autópsias de cérebros de pessoas com TEA indicam que existem alterações na estrutura e função cerebral. Uma descoberta comum é o aumento do volume cerebral em crianças pequenas com autismo, particularmente no córtex pré-frontal e cerebelo. Essas anomalias são evidências de que o desenvolvimento cerebral das pessoas com TEA é diferente desde o início da vida.
Além disso, pesquisas sobre a conectividade cerebral sugerem que indivíduos com TEA apresentam conectividade excessiva em algumas áreas e conectividade reduzida em outras. Isso pode explicar, em parte, os déficits em habilidades sociais e comunicação, bem como os comportamentos repetitivos que caracterizam o transtorno.
Outro fator neurobiológico importante é o desequilíbrio nos sistemas de neurotransmissores, especialmente os sistemas glutamatérgico e GABAérgico. Alterações na regulação desses neurotransmissores podem afetar a excitação e inibição das redes neurais, contribuindo para os sintomas do TEA.
Interações Gene-Ambiente e Epigenética
Uma área de pesquisa emergente na etiologia do TEA é a interação gene-ambiente. Sabe-se que o autismo não pode ser explicado apenas por fatores genéticos ou ambientais isoladamente. Em vez disso, é a interação entre esses fatores que pode desencadear o desenvolvimento do transtorno. Por exemplo, crianças com predisposição genética ao TEA podem ser mais sensíveis a fatores ambientais, como infecções maternas ou exposição a substâncias químicas durante a gestação.
A epigenética também tem atraído grande interesse dos pesquisadores. A epigenética estuda como fatores ambientais podem modificar a expressão gênica sem alterar a sequência do DNA. No caso do TEA, pesquisas epigenéticas indicam que alterações químicas no DNA, como a metilação, podem influenciar o desenvolvimento dos sintomas, especialmente em indivíduos geneticamente predispostos.
Conclusão
A etiologia do Transtorno do Espectro Autista é complexa, envolvendo uma interação dinâmica entre fatores genéticos, ambientais e neurobiológicos. Embora os avanços na pesquisa tenham permitido identificar vários genes e fatores ambientais associados ao TEA, ainda há muito a ser descoberto sobre como esses fatores interagem. O estudo das interações gene-ambiente e dos mecanismos epigenéticos oferece novas oportunidades para uma compreensão mais profunda das causas do TEA, possibilitando o desenvolvimento de intervenções mais eficazes e personalizadas no futuro.
Referências Bibliográficas
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